Exigência de 25 anos de contribuição limitaria benefícios.
Oito em cada dez trabalhadores que se aposentam hoje por idade contribuem para a Previdência menos tempo do que exigirá a proposta feita pelo governo Michel Temer, segundo reportagem da Folha de S. Paulo.
O texto da reforma estabelece que, para se aposentar, será preciso ter no mínimo 65 anos de idade e 25 anos de contribuição. Hoje, é possível obter o benefício com 15 anos de contribuição e 65 anos de idade, para homens, ou 60 anos, no caso das mulheres.
Números inéditos da Previdência mostram que 60% das aposentadorias por idade concedidas de janeiro a dezembro de 2015 foram para trabalhadores que não chegaram aos 20 anos de contribuição, e 79% haviam contribuído menos que os 25 que serão exigidos pela reforma.
A mudança deve atingir principalmente os mais pobres, que, em geral, contribuem por menos tempo, pois costumam ser mais sujeitos ao trabalho informal.
Por isso, são os trabalhadores da base da pirâmide os que mais recorrem à aposentadoria por idade. O valor médio dos benefícios (R$ 890) é menos da metade do pago, em média, aos que deixam o mercado pelo critério do tempo de contribuição (R$ 1.825). Ela também é majoritária nos Estados mais pobres do país.
É o caso de Maria Isabel da Cruz, 53, que ganha a vida hoje entregando folhetos no vale do Anhangabaú. No ano passado, teve carteira assinada, ao trabalhar na limpeza de um restaurante em São Paulo. Desempregada desde o final de 2016, não tem renda suficiente (ganha R$ 180 por semana) nem sabe como contribuir como autônoma. “Por isso eu queria um trabalho com carteira assinada. Mas estou procurando e não estou conseguindo”, diz.
Ela conta que teve outros trabalhos formais de curta duração. A maior parte da vida laboral ficou na informalidade. “Devo ter uns cinco anos de contribuição”.
Caso a proposta do governo seja aprovada como está, Maria Isabel entrará na regra de transição: o texto em discussão na Câmara dos Deputados abranda as novas exigências para mulheres acima de 45 anos e homens acima de 50 anos. Ainda assim, terá de trabalhar mais tempo. Como terá de pagar um pedágio (veja quadro), Maria Isabel só poderá se aposentar se contribuir por mais 15 anos, ou seja, aos 68. Pelas regras atuais, teria de contribuir mais 10: poderia se aposentar aos 63.
Para esses trabalhadores, pode ficar mais difícil alcançar os 25 anos de contribuição para se aposentar, afirma o professor de economia da USP Luís Eduardo Afonso.
“O grande impacto da reforma para quem se aposentaria por tempo de contribuição será o de se retirar mais tarde do mercado. Já para quem se aposentaria por idade, será mais complicado. Esse pode ser um subproduto indesejado da reforma.”
Afonso pondera que o intuito do governo é induzir o aumento do período contributivo, como nos anos 1990, quando o prazo de carência subiu de 5 para os atuais 15 anos. “As pessoas reagem a incentivos, e hoje é difícil saber se contribuem só 15 anos porque não podem ou porque não há incentivo para isso.”
Hélio Zylberztajn, também da USP, defendem como alternativa que a carência não seja uma trava. “Pode-se exigir um período para garantir o benefício pleno, e quem contribuir menos tempo recebe um valor proporcional.”
Apoio à reforma mapeado nas redes sociais
O governo federal está mapeando as redes sociais dos deputados para acompanhar quem é contra ou a favor da reforma da Previdência. Embora o discurso oficial seja de otimismo com as votações, o diagnóstico observado até o fim de janeiro preocupa: cerca de 60% da base aliada ainda não demonstrou qualquer posicionamento.
“É natural muita gente não se manifestar no início, mas o número é alto”, disse uma fonte do governo. Outra parcela próxima a 20% se declarou favorável, mas metade desse grupo faz ressalvas em relação a alguns pontos, como as mudanças nas regras de aposentadoria rural e a inclusão de policiais civis e federais na proposta geral – militares ficaram de fora. Os demais deram indícios de que podem votar contra a proposta, número que o governo vai trabalhar para reverter.
O monitoramento inclui a avaliação de declarações e postagens em sites, perfis no Facebook e no Twitter, na imprensa, além de identificação dos grupos de apoio ao parlamentar. As conclusões da equipe são documentadas em planilhas e consolidadas em gráficos. “Está muito forte a pressão para esse início de tramitação, nem começaram os trabalhos”, comentou a fonte. O grupo busca detectar pontos que podem causar “rachas” na base.
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